Comunidades indígenas de todo o Estado do Paraná estiveram representadas no Encontro Cultural da Pastoral Indígena e Indigenista do Regional Sul 2 da CNBB. O evento, realizado na Casa de Encontros e Eventos São João Diego, em Guarapuava (PR), ocorreu entre os dias 10 e 12 de fevereiro de 2023. Participaram cerca de 150 pessoas.
O bispo da diocese de Palmas e Francisco Beltrão, e também referencial da Pastoral Indígena e Indigenista no Estado, dom Edgar Xavier Ertl, esteve presente no encontro, assim como o coordenador, diácono Cirço Aparecido Nabor, de Londrina (PR).
Nos três dias do evento, indígenas das etnias Kaigang e Guarani tiveram a oportunidade de apresentar um pouco de suas culturas, como as comidas típicas, artesanatos, músicas e principalmente as danças. Também houveram trabalhos de conscientização sobre os direitos e deveres dos povos indígenas. A acreana Kixirá Jamandi, da etnia Jamandi, palestrou sobre o assunto e ofereceu aos participantes palavras de ânimo e incentivo.
Preconceito, depressão e suicídio
Uma questão que vem chamado a atenção das aldeias, autoridades públicas de saúde e famílias é o aumento dos casos de depressão e suicídio entre os jovens indígenas. Segundo o Ministério da Saúde, o número de pessoas que tiraram a própria vida entre os povos originários era cerca de três vezes maior do que média do país em 2018, apresentando leve melhora ao longo dos anos. As principais causas são a falta de noção de identidade, alcoolismo/drogadição, preconceito e falta de perspectivas para o futuro.
Segundo o professor Donizete Gomes da Silva, participante do encontro que trabalha com jovens indígenas da etnia Guarani em Diamante do Oeste (PR), os casos de suicídio na região “foram muitos, cerca de 80, e em um período de ano curto, um ano e meio”.
“Há uma dificuldade de entender o que está acontecendo. Muitas palestras foram feitas, junto com o pessoal de assistência social, professores, muita gente envolvida nos trabalhos, para tentar entender o que está acontecendo. Fomos observando e analisando o dia-a-dia desses alunos. […] Choramos muito pela perda de companheiros e companheiras. Por que tudo isso? Percebemos a juventude (indígena) perdendo a identidade. Com a tecnologia chegando, parece que as mentes dos nossos jovens não estavam preparadas. Começaram a se perguntar ‘quem sou eu?’, ‘eu sou guarani, branco ou o quê?’, ‘estou perdido’”, afirmou Donizete.
O professor finaliza dizendo que após muitas reuniões e palestras nas aldeias, contando com o apoio dos professores e assistentes sociais, os casos diminuíram, mas ainda é necessário entender o que está acontecendo nas tribos para conter o problema.
500 anos sem perder a cultura
Ananias Veríssimo é o cacique da Aldeia Rio da Lebre, localizada na terra indígena Rio das Cobras, município de Nova Laranjeiras (PR). Para ele, a cultura guarani é muito forte em relação à religiosidade do povo. Mesmo após 500 anos de contato com os europeus, o idioma, a cultura e o jeito de ser dos indígenas ainda permanecem:
“Nosso povo é um dos primeiros a ter contato com o povo europeu, na época da colonização. Isso mostra que o povo guarani mantém a tradição, independente de ter contato com outra civilização ou não. […] Estamos sempre nos renovando, pois com o passar do tempo (de colonização) houve muitos conflitos. Muitos povos perderam suas línguas, suas tradições, suas terras. O povo guarani luta, não descansa e sempre está reivindicando, junto aos governos, seus direitos. […] A permanência da nossa língua e da nossa cultura é através da nossa religiosidade. Temos a nossa casa de reza que o povo mantém até hoje, apesar de muitas interferências”, disse o cacique.
Cacique Ananias também destaca a importância da tecnologia, em especial dos novos meios de comunicação, para manter a cultura guarani:
“A tecnologia vem entrando e fazendo parte da nossa convivência e do nosso dia-a-dia. Os jovens tem muito contato com a tecnologia e com as redes sociais. […] Trouxemos essas ferramentas para a divulgação da realidade da nossa aldeia e nossos trabalhos pelas redes sociais, para uma sociedade que ainda está muito desinformada em relação à nossa cultura. A sociedade ainda pensa que os povos indígenas são um só, mas não é. Aqui no Brasil existe uma diversidade imensa de povos (indígenas) e línguas. Nossos jovens precisam conhecer nossa história, nossa luta, nossos rezadores […]”.
Uma casa para as famílias indígenas em Curitiba
Na capital do Paraná existe um local onde as famílias indígenas do Paraná e de outros estados que estão de passagem pela cidade podem encontrar acolhimento, repouso, alimentação e espaço para divulgar e vender seus trabalhos com artesanatos. É a Casa de Passagem e Cultura Indígena do Paraná. Não há custo de permanência para os atendidos, mas segundo o coordenador, Silas Ubirajara Donato de Oliveira, que apresentou os trabalhos para os participantes do encontro em Guarapuava, “é necessário passar por uma reunião onde são apresentadas as regras da casa”.
A instituição está vinculada à Fundação de Ação Social de Curitiba (FAS), que custeia as despesas de alimentação, do espaço e passagens para as famílias voltarem para suas aldeias, mas a gestão é feita por cinco voluntários, todos de ascendência indígena, que se comunicam em português, guarani e kaigang.
Segundo Silas, a coordenação da casa é referência para outras cidades e revela um grande objetivo a longo prazo: “se tudo der certo, cada município do Paraná terá uma casa de passagem com gestão indígena”.
Contato:
A casa de Passagem e Cultura Indígena está localizada na rua Rockfeller, número 1177, bairro Rebouças, em Curitiba. Tem capacidade para atender de 60 a 100 pessoas.
(41) 99653 6372 – Silas Ubirajara
(41) 99838 6189 – Ceia Kavenhkag Bernardo
E-mail: casadepassagemculturaindigena@gmail.com